Tela Etérea

No caminho para onde ia, reencontrei o pintor que um dia vi a pintar uma tela singularmente anónima e perguntei-lhe o que tinha feito com a mesma - "Está com alguém que viu para além do anonimato na sua cor", respondeu-me.
Confusa, continuei a olhar atentamente para os seus trabalhos, na esperança de ver algo mais. Nas suas cores e formas figurativamente abstractas, senti pedaços de vida etéreos, meus e de outros. Alegria, dor, solidão, paz, mas havia algo novo naqueles traços singularmente abstractos. Ainda não sabia o que era mas tinha a certeza que seria algo único, que por não ser verbalmente tradutível, estava ali sob a forma etérea de uma cor. Perguntei ao artista que cor seria aquela e porque nos fazia sentir confortavelmente pouco à vontade na sua presença?
Pousando o pincel e a paleta onde jazia um espetro de cores pastel, olhou-me e disse, sorrindo, como se me fosse contar um segredo, algo que ouvi e nunca esqueci.
Nesse mesmo dia, levei comigo uma tela de cores anónimas, para que também a pudesses contemplar com a tua singularidade. E, assim, talvez um dia, ela deixe de ser anónima, para quem a vê e vive.